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Especial: A importância de modernizar a frota de ônibus

 

A importância de modernizar a frota de ônibus.


[caption id="attachment_4247" align="alignnone" width="1000"]dsc_0785 Imagem: SIM TRANSPORTES[/caption]

Três milhões e meio de pessoas morrem no mundo a cada ano por causa da poluição atmosférica; este número é muito maior do que as mortes associadas ao consumo de água contaminada e falta de serviços de saúde adequados. Cerca de cincoenta porcento das mortes associadas à poluição atmosférica estão associadas às emissões dos transportes, especialmente os veículos movidos a diesel. Além desse impacto sobre a mortalidade, a poluição do ar aumenta a prevalência de doenças, os custos do sistema de saúde pública, reduz a renda e afeta a produtividade. De acordo com o Banco Mundial, a poluição do ar em países em desenvolvimento pode ter um custo econômico equivalente a 3,2% do PIB.

Segundo o Conselho Internacional de Transporte Limpo (ICCT), apesar dos progressos do Programa Nacional de Controle da Poluição por Veículos Automotores – PROCONVE (licenciamento ambiental de veículos novos), a poluição do ar em São Paulo ainda está muito acima dos níveis recomendados pela Organização Mundial da Saúde (OMS, 2005). Estudos do Instituto Saúde e Sustentabilidade e da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo indicam que morrem no Estado, cerca de 16 mil pessoas por ano – 8 mil na Região Metropolitana de São Paulo – RMSP e 4 mil na capital.

Não só muitas cidades em São Paulo excedem os padrões de qualidade do ar (PQAr) nacionais para MP10 (partículas inaláveis tóxicas com diâmetro abaixo de 10 micron), mas nenhuma cidade cumpre as recomendações da OMS. A mesma tendência é observada para os demais poluentes monitorados.

Os veículos que utilizam diesel, tais como ônibus e caminhões, têm emissões de fuligem (carbono negro ou black carbon – BC contido no MP): um poluente que tem impacto sobre a saúde e ao mesmo tempo, contribui com as mudanças climáticas. Quando o BC é depositado no gelo ou na neve, a temperatura aumenta e acelera o derretimento. O BC também afeta os processos de formação de nuvens e os padrões de chuva. Por essa razão, o ele é considerado o poluente climático mais importante depois do dióxido de carbono – CO2. Assim, a adoção de regulamentos mais avançados como Euro 6 permite benefícios, tanto para a proteção da saúde local, como do clima global do planeta.

Os transportes públicos, incluindo os ônibus e o metro, são a espinha dorsal da mobilidade das pessoas em áreas urbanas; em associação aos modos de transporte não motorizados, como a bicicleta e a caminhada, constituem a chave do transporte sustentável. Independentemente desses benefícios, o uso de combustíveis fósseis em ônibus urbanos tem um relevante impacto na qualidade do ar, especialmente no caso do diesel, que produz emissões de partículas finas cancerígenas e gases tóxicos, sendo uma das mais importantes fontes de poluição, muito danosa para a saúde. Além disso, pela natureza do serviço que prestam à comunidade, os ônibus geram uma poluição espalhada por toda a cidade, ao contrário das indústrias, que tendem a ter impactos localizados.

O Brasil tem feito um grande esforço na adoção de tecnologias mais limpas, principalmente por meio do PROCONVE, que começou a surtir seus efeitos em 1989, exigindo o atendimento de limites máximos de emissão de poluentes tóxicos para automóveis, e para caminhões e ônibus novos, em 1992 – e bem mais tarde, em 2002, para as motocicletas. Esse programa permitiu progressos na indústria seguindo os padrões internacionais, atingindo para os veículos a diesel em 2012 o equivalente às regras da União Europeia Euro V –  fase P7 do PROCONVE. Em grande parte, o ritmo dessa evolução tem sido marcado pela disponibilidade de um diesel mais limpo, com menor teor de enxofre, necessário para o bom funcionamento dos sistemas avançados de controle de emissões.

Infelizmente, esse progresso da regulação não foi suficiente, pois os níveis de poluição ainda ameaçam a saúde da população em muitas áreas urbanas do país, sendo necessária a introdução de tecnologias mais limpas, por intermédio da renovação das frotas de ônibus e caminhões e demais veículos a diesel. Portanto, uma nova etapa mais rigorosa na redução da contribuição do transporte público e dos demais veículos a diesel novos para a contaminação atmosférica, deve ser consignada o quanto antes, considerando dois aspectos fundamentais: a proteção da saúde pública e a competitividade internacional da indústria automobilística brasileira.

No tocante à proteção da saúde, um estudo recente da Agência Internacional de Energia conduzido pelo Centro de Desenvolvimento Tecnológico da Finlândia (VTT), mostrou que a única tecnologia que produz uma redução das emissões em condições reais de operação na rua, é a tecnologia Euro 6, que corresponde à próxima fase do PROCONVE (P8), que já vem sendo discutida há vários anos, mas ainda não há sinais de definição da data de sua entrada em vigor. O regulamento atual (Euro 5) e os anteriores, não trazem melhoria das emissões reais em trânsito. Isso significa, que a continuidade da renovação da frota de ônibus com as normas vigentes no Brasil custa muito à saúde pública, especialmente considerando que os veículos adquiridos irão permanecer em operação nas frotas de ônibus pelo menos até ao final da próxima década – e muitos atingirão até trinta anos de operação contínua, emitindo grandes quantidades de produtos tóxicos na atmosfera.

Adotar Euro 6 requer teor de enxofre do diesel inferior a 10 ppm (ultra low sulfur diesel – ULSD), que já está disponível em áreas urbanas, mas ainda não, em todo território brasileiro. Por essa razão, pode-se começar os avanços pela adoção das normas Euro 6 somente para os ônibus urbanos, que já podem fazer uso do ULSD, enquanto no nível federal o diesel com 500 ppm de enxofre segue sendo alterado para o ULSD – o que permitirá em breve a adoção do padrão Euro 6 para caminhões e ônibus rodoviários interurbanos em circulação em todo território brasileiro.

Adotar Euro 6 também exige o desenvolvimento de capacidade nacional de certificação veicular mais avançada, que permite medir os veículos em condições reais de operação na rua – um pré-requisito para evitar as falhas observadas nos regulamentos anteriores a Euro 6, que induzem fabricantes a demonstrarem a conformidade ambiental em condições que, de fato, não refletem a realidade de operação nas ruas. A indústria brasileira automotiva tem capacidade tecnológica similar ou superior àquela de outros países que já adotaram Euro 6, como China e Índia; portanto, não haverá dificuldades na adoção brasileira dos novos e necessários regulamentos de testes mais avançados, já em operação plena nos países desenvolvidos.

Mas não é apenas um risco para a saúde, trata-se de um risco comercial. A China, que compete cada vez mais com o Brasil no mercado latino-americano para ônibus e caminhões, aprovou Euro 6 para 2017 em Pequim, e em 2020 para todo país. A Índia já anunciou que vai seguir o mesmo caminho, e os sinais na América Latina são claros: o Chile já decidiu que a partir de 2019 só irá permitir ônibus Euro 6 em Santiago. Bogotá e Cidade do México estão tomando decisões similares e adotando filtros de partículas adaptados (retrofit) nos veículos em uso mais poluentes. Há também sinais de que a Argentina está iniciando um processo de discussão sobre a adoção do Euro 6, então é muito provável que em 2020 esse seja o novo padrão para os ônibus em grande parte da região. Se o Brasil não adotar rapidamente seu PROCONVE P8, perderá sua liderança no mercado latino-americano – em primeiro lugar para ônibus e, em seguida, para caminhões, o que seria má notícia para a indústria automobilística que já atingiu com a crise econômica uma queda significativa na demanda de veículos no mercado interno.

A indústria automotiva internacional está mudando muito rápido. Veículos que veremos na próxima década, serão bem mais eficientes com a incorporação de tecnologias híbridas e elétricas, conectados à Internet, e muitos deles autônomos. A adoção de normas mais avançadas cria melhores condições para penetração dessas tecnologias, promovendo a evolução da indústria. A adoção de Euro 6 é um passo importante para o Brasil competir no futuro nesse novo mercado, e irá também produzir muitos benefícios, mediante maior proteção da saúde da população.

Gianni Lopez é Diretor do Centro Mario Molina Chile, instituição associada ao Climate and Clean Air Coalition – CCAC –  na implementação de medidas de mitigação de emissões de Carbono Negro e poluentes de vida curta

 

Com informações:

Artigo originalmente publicado na Revista Autobus – 

http://www.revistaautobus.com.br/

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